Lília Finelli

Como sei se posso contratar alguém como PJ, no lugar de CLT?

Guia rápido para distinguir as modalidades e entender o que é fraude trabalhista

O Brasil tem um sistema de relações trabalhistas que traz muitas dúvidas até para os advogados, que dirá para os empresários. Neste artigo, vou tentar explicar da forma mais clara possível quando você pode contratar alguém na modalidade PJ (pessoa jurídica) e quando o uso dessa modalidade é só uma fraude que gera um risco para o seu negócio.

Lembrando que empresa é risco mesmo, então não entenda as minhas observações como um grande “NÃO PODE FAZER ISSO”. É só meu papel te alertar sobre o que pode acontecer.

Vamos começar do básico?

O básico é entender a que nossa legislação diz. Assim, você não vai ficar com tanta dúvida. Mais pra frente, deixei também um checklist pra você ver se está se arriscando com a contratação que quer fazer. Aguarda aí e segue lendo.

Nossa legislação diz que a relação trabalhista envolve um empregador (você que está lendo) e uma pessoa física (um ser humano, né, robô não vale), que presta serviços pra você de forma pessoal (não manda ninguém no lugar), não-eventual (não aparece lá o dia que quer), subordinada a você (não faz as coisas só do jeito que quer), recebe dinheiro em troca do trabalho (vulgo salário) e não tem nada a ver se o seu negócio quebrar. Você que paga o pato.

São os chamados “requisitos da relação empregatícia”, também conhecidos como: pessoa física, pessoalidade, não-eventualidade, subordinação, onerosidade e alteridade.

De onde veio isso de CLTxPJ?

De onde saiu então essa confusão entre contratar no regime trabalhista (também conhecido como CLT, que é a sigla da legislação) e contratar como se fosse uma pessoa jurídica?

Saiu do fato de que contratar pelo regime celetista é mais caro do que contratar como PJ, simples assim. E é mais caro porque, ao contratar alguém pela CLT, você não paga só salário. Paga um tanto de outras coisas, quer ver?

Contratando um empregado pagando um salário-mínimo de 2024 (R$1.412,00), com vale-transporte de um ônibus ida-volta (R$10,50/dia) sem dar nenhum benefício (vale-alimentação, plano de saúde etc.), ele vai te custar R$2.228,68 e vai receber R$ R$ 1.784,09.

Contratando uma pessoa jurídica pagando um salário-mínimo de 2024 (R$1.412,00), pagando auxílio de um ônibus ida-volta (R$10,50/dia) sem dar nenhum benefício (vale-alimentação, plano de saúde etc.), ele vai te custar R$1.632,50 e vai receber R$1.632,50, ficando a cargo dele pagar a tributação (em geral em torno de 4,5%).

Como a contratação PJ te custa muito menos, você não só vai preferir ela, como o empregado também tende a preferir, porque aí você pode colocar mais benefícios na conta dele, já que esse dinheiro a mais não vai ser dobrado por incidir em outras verbas.

Dei uma simplificada, mas você pode fazer esses cálculos em duas ferramentas:

O brasileiro, que não é idiota, só fez as contas: se eu empregador vou pagar mais e o empregado vai receber menos do que poderia, vou dar um jeito de não categorizar essa relação como trabalhista.

Aí que vem o problema

E o problema é que a legislação trabalhista não permite que isso aconteça. Se a relação tem os requisitos da CLT, você não pode escolher se contrata como CLT ou não. Se a realidade mostra que aquela pessoa é sua empregada, ela é regida pela CLT e fim de papo.

Ou até pode escolher contratar como PJ, mas tem o risco de ser processado e aí, meu amigo, você vai perder (embora às vezes compense. Se não compensasse, não tinha tanta gente que fazia, concorda?).

O raciocínio que muitos fizeram é, na verdade, considerado como fraude trabalhista. É basicamente eu pegar uma pessoa pra trabalhar pra mim e fingir que ela não tem uns dos requisitos da relação de emprego, em especial o requisito de ser pessoa física (porque ela vai lá e abre uma pessoa jurídica, que não é pessoa física) e o da subordinação.

Nesse último aqui, você finge que a pessoa não precisa obedecer suas ordens, chegar todo dia no mesmo horário, prestar contas, ou seja, ser seu empregado.

“Lília, mas pode acontecer de a pessoa realmente ser um prestador de serviços, né?”

Claro que pode!

Pra deixar mais claro, segue um checklist pra você saber se está contratando alguém PJ contra a legislação (fraude, e aí não estou te julgado, estou só te alertando) ou se realmente é uma relação só de prestação de serviços empresariais:

Checklist para saber se a pessoa realmente pode ser contratada como PJ (MEI, LTDA, autônomo com RPA, tanto faz)

Responde aí às seguintes perguntas:

  1. Essa pessoa vai prestar os serviços como?
  2. Ela vai na sua empresa todo dia, nos mesmos horários, você controla a jornada dela?
  3. Suponhamos que ela trabalhe de casa. Você fica controlando o horário dela? Fica mandando em tudo que ela vai fazer ou ela tem total autonomia para trabalhar?
  4. Só serve ela pra prestar o serviço? Ou ela pode delegar, pedir pra outra pessoa ir?
  5. Ela vai coordenar outras pessoas? Vai ter um time? Vai ter férias? O RH vai lá falar com ela quando estiver com um mau comportamento?
  6. Se amanhã ela falar que não vai, você vai dizer que não pode? Ou seja, sua expectativa é que ela trabalhe da forma como você quer?

Vou dar um exemplo de PJ: PJ não tem chefe. Ninguém controla seu horário, ele só precisa entregar o que foi combinado. O PJ tem autonomia, não tem jornada, não tem férias, não é subordinado a ninguém.

Tá ficando mais claro que a maioria dos casos é só uma fraude trabalhista mesmo? Você contratando uma pessoa pra pagar menos e ela ganhar mais, mas no final ela é sua empregada? Com isso não quero te fazer sentir mal. Eu também acho que a gente deveria poder escolher como quer contratar e como quer ser contratado, mas a legislação brasileira não acha isso.

É exatamente porque acaba sendo mais vantajoso financeiramente que essa dúvida sempre aparece. Se fosse tão bom assim para todos contratar CLT, não ia haver dúvida alguma.

Segue meu alerta

O ser humano sempre foi assim: se está ruim pra ele, ele vai arrumar um jeito de ficar bom. É o caminho natural. Acontece que essa legislação não permite escolher e agora vou te explicar os riscos, ok?

Se eu contrato uma pessoa que tem os requisitos da relação empregatícia como PJ, o risco é eu ser processado na Justiça do Trabalho, e isso é bem comum. Eu sei que provavelmente algum prestador de serviço já quis te convencer que é muito melhor você contratar ele como PJ, porque hoje em dia até empregada doméstica quer ser contratada só como MEI. E se bobear falou: “que que custa?? Vai ser melhor pros dois lados!”

Custa o risco de ser processado.

E isso ocorre com frequência, tá? Nesse caso, os valores podem ser expressivos, porque provavelmente você aceitou pagar mais por ser PJ (algo entre os R$2.228,68 e os R$1.632,50) e esse valor vai ser considerado como o salário-base.

Aí, no final, em vez de te custar R$2.228,68 por mês, vai custar beeeem mais e numa cacetada só, porque com esse valor aí por mês de salário-base, no regime celetista ele te custaria na verdade R$ 3.390,18 por mês, sobre os quais você ainda vai pagar atualização e o advogado pra te defender.

O que fazer, então?

Eu sou advogada trabalhista empresarial. Entendo sua dificuldade: você quer pagar um bom valor, sem ser tão onerado. E, com o custo do regime celetista, às vezes não consegue bons empregados.

Só que isso é questão de estratégia.

É possível contratar bons empregados pela CLT sem nenhuma fraude, usando benefícios que não têm reflexos salariais, promovendo um bom ambiente, uma boa cultura; e tem empresário que vai preferir assumir o risco, afinal, PJ ou CLT, no fim das contas esse risco sempre será dele. Nos dois casos, o melhor é que um advogado especialista te ajude com essas questões, para que a sua escolha seja realmente informada e não do que sei lá que falou que era.

Ficou mais claro?

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